A DUPLICATA MERCANTIL
A duplicata, ao
contrário dos primeiros dois tipos de título de crédito que estudamos, é um
título de crédito tipicamente brasileiro, portanto não está adstrito às regras
introduzidas em nosso sistema pelo Tratado de Genebra.
Desde o Código
Comercial de 1850, em seus arts. 219 e 427, já havia a previsão se que, havendo
vendo no atacado, deveria o comerciante extrair duas vias uma relação das
mercadorias vendidas, ambas assinadas pelas partes contratantes, assim como, a
fatura assinada pelo comprador serviria como título com efeitos cambiais para
ser base de processo de execução.
Nos dias de hoje, após a extração
da nota fiscal de uma venda a prazo, emite-se a fatura para ser apresentada ao
comprador, emitindo-se, conseqüentemente, a duplicata. Pela criação da
duplicata mercantil (saliente-se que, já no Código Comercial de 1850, falava-se
me vendas no atacado, ou seja, entre comerciantes – natureza mercantil e não
consumidora da negociação), a lei optou por proibir a emissão de nota promissória
ou letra de câmbio quando o negócio que sua origem é uma compra e venda
mercantil.
A duplicata é um título causal, o
que significa que sempre estará vinculada à relação jurídica que lhe deu
origem, que é a compra e venda mercantil. Somente a compra e venda permitem
o saque da duplicata mercantil.
CONCEITO DE
DUPLICATA
A lei obriga, entre partes
domiciliadas no Brasil, a emissão de fatura em toda venda mercantil, com prazo
não inferior a 30 dias, onde o vendedor descreve as mercadorias vendidas ou
indica, apenas, os números e valores das notas fiscais expedidas. Permite-se
que a nota fiscal e a fatura estejam num mesmo documento, chamada Nota
Fiscal/Fatura, facilitando tanto o aspecto comercial quanto o fiscal e o
negocial, pois a quantidade de documentos que o empresário hoje deve manter
corretamente escriturados já é excessiva (claro, se falarmos em empresário
regular... os irregulares não têm escrituração, pois mal recolhem impostos, ou
tem segurança jurídica).
Emitida a fatura, poderá o empresário
extrair uma duplicata. “Nula é a duplicata, mesmo aceita, cujo saque
corresponde não a contrato de compra e venda mercantil, mas a ato de novação de
dívida” (in RT 640/188). A novação de dívida, como também já vimos em nossas
aulas, normalmente acontece através de contrato de confissão de dívida,
documento o qual, firmado pelas partes e duas testemunhas, também é hábil a
embasar ação executiva.
A duplicata mercantil é, dessa
forma, saque do empresário contra o comprador de mercadorias a prazo
(essa característica é muito importante). Com base em uma ou mais notas
fiscais, o empresário extrai a fatura, sendo a duplicata, praticamente, a sua
cópia. Não uma mera reprodução, mas um documento para o empresário fazer
circular. É a fatura, o documento do contrato de compra e venda mercantil,
que enseja a emissão da duplicata.
A fatura deve ser,
obrigatoriamente, extraída; a extração da duplicata é facultativa, mas,
conforme aduzido pelo ilustre doutrinador Rubens Requião (Curso): “será o único título de crédito suscetível de
ser sacado, com fundamento em contrato de compra e venda mercantil. A lei veda
expressamente, no art. 2.º, a extração de qualquer outra espécie de título de
crédito (letra de câmbio ou nota promissória) para documentar o saque do vendedor
pela importância faturada ao comprador”.
A duplicata, após receber o
aceite, passa a ser um título de crédito, circulável à ordem, ou seja, por
endosso; antes não, pois é apenas um documento.
DUPLICATA COMO TÍTULO DE CRÉDITO
Quando a duplicata constituída,
formada, não é um título de crédito. Ao receber o aceite é que ela passa a ser
um título de crédito, portador dos princípios da literalidade e da
autonomia, que tanto já estudamos.
Não custa nada fazermos uma
recapitulação: o princípio da literalidade faz com que não se admita
discutir o que se encontra expresso no título, pois vale o que está nele
inserido; já o princípio da autonomia determina
o desligamento do título da relação que lhe deu origem, ligado á idéia de
abstração.
É com a aplicação desses
princípios que a duplicata torna-se abstrata, valendo apenas pelo que expresse
o seu conteúdo, circulando livremente. Para que haja a livre circulação,
necessário o aceite, que deve ser visto com maior cautela.
Aceite
O aceite nada mais é que a declaração
na qual o comprador assume, aceita a obrigação de pagar a quantia indicada no
título, na data do vencimento. O aceite existe em duas modalidades: expresso ou
tácito.
Expresso, quando o devedor
efetivamente coloca sua assinatura no título. Tácito, quando o devedor recebe a
duplicata para o aceite e deixa passar o prazo de 10 dias, contados da
apresentação, sem qualquer comunicação, por escrito, ao credor. Quando o
devedor deixa passar in albis esse
prazo, a lei dispõe que o devedor aceitou a duplicata. O aceite tácito está no
artigo 15, da Lei das Duplicatas, que hoje tem a seguinte redação:
“A cobrança
judicial de duplicata ou triplicata será efetuada de conformidade com o
processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, de que cogita o Livro
II do Código de Processo Civil, quando se tratar:
I – de duplicata
ou triplicata aceita, protestada ou não;
II – de duplicata
ou triplicata não aceita, contanto que, cumulativamente:
a) haja sido
protestada;
b) esteja
acompanhada de documento hábil comprobatório da entrega e recebimento da
mercadoria;
c) o sacado não
tenha, comprovadamente, recusado o aceite no prazo, nas condições e pelos
motivos previstos nos artigos 7.º e 8.º desta Lei”.
O artigo 7.º estabelece o prazo de
10 dias e o artigo 8.º, indica os motivos pelos quais o devedor poderá
fundamentar sua recusa, que são:
I – avaria ou não recebimento das
mercadorias, quando não expedidas ou não entregues por sua conta e risco;
II – vícios, defeitos e diferenças
na qualidade ou na quantidade das mercadorias;
III – divergência nos prazos ou
nos preços ajustados.
Em suma: é a assinatura do devedor
que caracteriza o título de crédito. A duplicata, ao receber aceite, libera-se
definitivamente de sua origem (abstração) e não se discute mais o que está
expresso no título, podendo transitar livremente. É o aceite, portanto, que
transforma a duplicata num titulo de crédito propriamente dito.
REQUISITOS DA DUPLICATA
O artigo 2.º, § 1.º, da Lei n.º
5.474/68, assim como nos demais títulos de crédito que já estudamos, dá os
requisitos de uma duplicata. São eles:
a) a denominação “duplicata”, a
data de sua emissão e o número de ordem;
b) o número da fatura;
c) a data certa do vencimento ou a
declaração de ser a duplicata à vista;
d) o nome e o domicílio do
vendedor e do comprador;
e) a importância a pagar, em
algarismo e por extenso;
f) a praça de pagamento;
g) a cláusula “à ordem”;
h) a declaração do reconhecimento
da sua exatidão e da obrigação de pagá-la, ao ser assinada pelo comprador como
aceite cambial;
i) a assinatura do emitente.
Dois
itens merecem maior destaque. O primeiro deles é o número da fatura que deve
ser o mesmo da duplicata, por ser aquela, irmã gêmea desta. Nessas condições,
uma só duplicata não poderá corresponder a mais de uma fatura, mas uma só
fatura poderá corresponder a duas ou mais duplicatas, como acontece nas vendas
à prestação, nas quais poderá aparecer uma série de duplicatas, uma para cada
prestação, com a mesma numeração da fatura e com o acréscimo das letras do
alfabeto, em seqüência.
O outro ponto que merece destaque
é a cláusula à ordem, o beneficiário do título deve ser sempre pessoa
determinada, transferível por endosso. Não existe, pois, duplicata ao portador,
quando emitida. Como vimos na nota promissória e na letra de câmbio, no título
pode estar expresso quem é o credor. Caso esse credor faça um endosso em
branco, o título passa a ser ao portador, valendo o princípio da cartularidade.
DUPLICATA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
A duplicata é um título causal, diferente
dos demais que tínhamos visto até agora, que tem sua base no contrato de compra
e venda mercantil ou na prestação de serviços.
O artigo 20 da Lei n.º 5.474/68,
autoriza os empresários individuais, as sociedades e as fundações a fazerem
extração de duplicatas que correspondam à prestação de serviços em quantias
iguais às respectivas faturas, que discriminarão a natureza dos serviços
prestados.
PERDA OU EXTRAVIO DA DUPLICATA
Caso venha a ser extravia ou haja
a perda da duplicata, a Lei da Duplicata autoriza o vendedor a extrair uma
triplicata, ou seja, uma cópia da duplicata, que terá os mesmos efeitos,
requisitos e formalidades desta.
Isso pode parecer estranho em
razão da idéia de cartularidade. No entanto, por ser um título de crédito
causal, a duplicata permite a emissão de uma segunda via.
A jurisprudência vem se acentuando
no sentido de que, quando o devedor, por exemplo, ao receber a duplicata para
aceite, retenha o título, não permitindo sua circulação, pode o credor emitir
triplicata em substituição, a fim de circular o crédito ou mesmo cobrar o valor
devido.
PRESCRIÇÃO DA DUPLICATA E O PROTESTO
A Duplicata tem prazo
prescricional de 03 anos, conforme art. 18 da Lei de Duplicatas, contra o
sacado (devedor). A cobrança contra os endossantes e seus avalistas tem prazo
de um ano, contado da data do protesto.
O protesto da duplicata deve ser
efetuado na praça (local) de pagamento constante da duplicata, no prazo de 30
dias a contar de seu vencimento. O protesto é requisito para o credor não
perder o direito creditício contra os coobrigados (endossantes e seus
avalistas). Contra o devedor principal e seu avalista não é necessário o
protesto.
AÇÃO JUDICIAL PARA COBRANÇA DA DUPLICATA
Desde que seja um título de
crédito (aceite e tenha todos os requisitos acima estudados), a cobrança da
duplicata será feita através de ação de execução.
Importante referir que a duplicata
sem o aceite expresso, para ser base de ação executiva, deve estar acompanhada
do comprovante da entrega da mercadoria, além do protesto. A consumação do
aceite tácito também é necessária.
“Art.15 (LD) O
sacado não tenha, comprovadamente, recusado o aceite, no prazo, nas condições e
pelos motivos previstos nos arts. 7.º e 8.º desta lei”
A forma como ocorre o aceite tácito já vimos
em item anterior.
A duplicata, atualmente, é o
título mais utilizado (depois do cheque, evidentemente), tendo papel importante
na vida empresarial e na saúde financeira de grande parte dos empresários
brasileiros.
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